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Quem? Como? Pode ser eleito presidente das CCDR? / A democratização do modelo de designação das direções das CCDR (artigo) / Entrevista com o Presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada / Outros temas

1 – Quem? Como? Em que termos? Pode ser eleito presidente nas próximas eleições paras as presidências das Presidente das CCDR?

Até junho deste ano, os Presidentes das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional CCDR vão passar a ser eleitos.

Dado o curto espaço temporal para esta eleição, seria importante conhecer algumas respostas para algumas interrogações do processo eleitoral, nomeadamente, sobre “quem” pode candidatar-se:

  • Todos os cidadãos com capacidade ativa, maiores de 18 anos?
  • Só podem concorrer cidadãos indicados pelo Governo?
  • Só podem concorrer cidadãos indicados pelas autarquias?
  • Só podem concorrer cidadãos indicados pelos partidos políticos?
  • A sociedade civil pode indicar candidatos?
  • Os candidatos para concorrerem têm de passar por um processo prévio da CRESAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública)?
  • Os cidadãos de outros países da União Europeia podem candidatar-se?
  • Os membros dos órgãos autárquicos estão impedidos de se candidatarem?
  • Como vai ser definido o “quadro” das inelegibilidades gerais?
  • Como vai ser definido o quadro das inelegibilidades especiais?

 

Como vai ser o processo e a eleição:

  • Por voto secreto?
  • Se o candidato mais votado não tiver maioria, tem de haver uma segunda volta?
  • Os esclarecimentos cívicos vão ser prestados pela Comissão Nacional de Eleições?
  • O membros dos colégios eleitorais para exercerem o direito de voto, necessitam de se inscrever (obrigatoriamente) num caderno  eleitoral? Caso o entendam, podem recusar a sua inscrição?
  • Como vai ser assegurada a igualdade de oportunidades das candidaturas?
  • Os candidatos vão ter mandatários?
  • A candidatura (tal como nos outros atos eleitorais) é afixada à porta do edifício do tribunal?
  • Em caso de irregularidades processuais ou de candidatos inelegíveis é o tribunal que realiza a notificações?
  • É licita a desistência do candidato? Até quantas horas antes da eleição?
  • Vamos ter um período para campanha eleitoral?
  • Os órgãos do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais, não podem intervir direta ou indiretamente na campanha eleitoral? Ou dadas as especificidades desta eleição, tal será possível?
  • Vai haver liberdade de reunião para fins eleitorais em edifícios públicos?

Conforme se pode constatar, ainda temos muitos aspetos a serem definidos, mas (certamente) em breve serão dados a conhecer. No entanto, a Direção da Associação, Observatório das Autarquias Locais, está a ponderar realizar um Inquérito Nacional para se conhecerem opiniões e indicações dos envolvidos neste processo de eleição.

 

2 – Artigo do Sr. Dr. Luís Filipe Mota Almeida[1]“A democratização do modelo de designação das direcções das CCDR: uma boa solução?”

Como tem sido nosso “timbre”, somos uma Associação que divulga temas técnico-científicos, e todos os artigos de opinião são sempre publicados, mas vinculam apenas os seus autores.

“Com o intuito de democratizar a governação territorial e cumprindo uma promessa eleitoral constante do programa eleitoral do Partido Socialista, o XII Governo Constitucional consagrou no seu Programa de Governo[2] para a XIV Legislatura, no relatório do Orçamento do Estado para 2020[3] e na Proposta de Lei de Grandes Opções do Plano[4] a eleição democrática das direcções executivas das cinco Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). Segundo estes documentos, esta eleição far-se-á por via de um colégio eleitoral composto pelos membros das Câmaras Municipais e das Assembleias Municipais, incluindo os Presidentes de Junta de Freguesia (como seus membros por inerência) e a direcção executiva responderá perante o Conselho Regional. Segundo declarações públicas do Senhor Primeiro-Ministro, Dr. António Costa, e reafirmadas pela Senhora Ministra da Coesão Territorial, Professora Doutora Ana Abrunhosa, em audição na Assembleia da República no âmbito da discussão na especialidade do Orçamento do Estado de 2020, o objectivo é ter concluídos os diplomas que consagram este novo modelo de eleição no primeiro trimestre de 2020 e levar a cabo as eleições das cinco CCDR já em 2021.

Esta medida tem o mérito de legitimar um alargamento das respectivas competências e atribuições e de criar uma base para um nível intermédio de poder. De resto a existência de uma lógica de governação multinível no nosso país, tão incentivada pelo Conselho da Europa[5], asseguraria com clareza a existência de uma dimensão que hoje existe apenas de forma insuficiente através das Comunidades Intermunicipais e que poderia trazer benefícios claros no quadro dos fundos da União Europeia e da política regional da União Europeia e permitiria uma maior descentralização de funções, que sem este nível de poder ficariam a cargo do poder estadual.

Contudo, e apesar dos aparentes méritos, a institucionalização de um modelo mais democrático nas CCDR levanta-nos as maiores dúvidas e exige um debate maior por parte da sociedade civil – que está por fazer.  Desde logo, deve sublinhar-se que é claro para todos que esta é uma medida que pretende trazer um reforço da divisão regional do território continental por via de um “sucedâneo” das Regiões Administrativas, o que, em nosso entender, traz pelo menos três grandes problemas. Por um lado, esta medida pode trazer um bloqueio ao tão necessário reforço da legitimidade democrática dos órgãos das Áreas Metropolitanas, uma vez que estamos perante realidades paralelas, o que no futuro pode gerar dificuldades de coabitação com confusões na repartição de atribuições e competências, pelo que a avançar esta medida devia ser cuidadosamente desenhada e evitar um certo abstencionismo na delimitação das atribuições e competências, de modo a serem evitados efeitos contraproducentes. Por outro lado, não podemos esquecer que as CCDR são órgãos desconcentrados do Estado pelo que, ainda que a legitimação democrática destas entidades seja positiva, tal não representa por si uma verdadeira descentralização, já que parece duvidoso que debaixo da malha do controlo do poder estadual estas entidades prossigam realmente os respectivos interesses próprios e que haja uma verdadeira liberdade de autodefinição da sua orientação político-administrativa.

Finalmente, e embora este seja muitas vezes um pormenor esquecido, a concretização dos termos concretos desta medida deverá ser o mais rigorosa possível, já que em termos gerais se poderá pôr em causa a reserva de representatividade democrático dos órgãos representativos das inexistentes Regiões Administrativas (já que este modelo pode fazer com que o espaço próprio dos órgãos das Regiões Administrativas constitucionalmente consagrado seja ocupado pelas CCDR e pelos seus respectivos órgãos[6]) e dos órgãos dos Municípios (já que pode trazer um reforço encapotado da tutela do poder estadual e uma limitação da respectiva liberdade de acção).

Deste modo e face ao exposto, parece-nos que a solução defendida pelo Governo não se nos afigura como a melhor e a via adequada traduzir-se-ia em duas soluções que seriam preferíveis. Por um lado, com o intuito de se criar verdadeiro nível intermédio de poder, dever-se-ia  avançar para uma reabertura do processo de discussão da criação das Regiões Administrativas no nosso País. Contudo, sublinhe-se que não existem no actual quadro político condições objectivas para que se criem efectivamente as Regiões Administrativas, pelo que, em nosso entender, o caminho a trilhar durante esta XIV Legislatura deve ser o de uma revisão constitucional  que clarifique o sentido no disposto no art. 256.º da Constituição  de modo a evitar que este processo (no caso de ser retomado na XV Legislatura) seja marcado por dúvidas que o podem viciar à partida. Idealmente esta revisão constitucional deverá promover a supressão da referência à obrigatoriedade da constituição das Regiões Administrativas, consagrando a institucionalização da regionalização como uma mera faculdade e, tendo em conta a rejeição da regionalização em 1998, deverá esclarecer qual o tipo de referendo exigido pela constituição e qual a percentagem de votantes que se satisfaz para que o referendo seja vinculativo.

Por outro lado, quanto direcção das CCDR importa não esquecer que, à luz do art. 3.º/1 do Decreto-Lei n.º 228/2012, de 25 de Outubro, quando falamos dos cargos de Presidente e Vice-Presidentes das CCDR estamos a falar de cargos dirigentes da Administração Pública. Pelo que, em nosso entender, o caminho não deve ser o da consagração de um modelo de eleição – que tendencialmente acentuará a componente política deste cargo dirigente e poderá levar à ocupação deste por quadros políticos da confiança do partido do Governo ou do partido que tem a maioria das Câmaras Municipais na região -, mas antes o da profissionalização total destes cargos (e de todos os cargos dirigentes), através de um modelo que garanta uma lógica meritocrática que assegure que todo o seu processo de recrutamento e seleção passaria a ser conduzido pela Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública (CReSAP) que no final do procedimento concursal apresentaria o nome do melhor candidato ao Governo – que, salvo casos muito limitados, tê-lo-ia obrigatoriamente de nomear para o cargo[7].”

1 – Licenciado em Direito e Mestre em Direito Administrativo pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e investigador associado no Centro de Investigação de Direito Público da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. luisfilipemotaalmeida@gmail.com.

2 – Programa do XII Governo Constitucional (2019-2023), página 35.

3 – Relatório do Orçamento do Estado para 2020, Dezembro de 2019, página 88.

4 – Proposta de Lei n.º 4/XIV, página 37.

5 – Conselho da Europa, «Local and regional democracy in Portugal», CG (22) 11, 29/3/2012, Monitoring Committee, Congresso dos Poderes Locais e Regionais do Conselho da Europa (disponível AQUI).

6 – Tendo, aliás, Pedro Machete em Declaração de voto no Acórdão n.º 296/2013 do Tribunal Constitucional referido sucintamente este aspecto em relação ao espaço que se pretendia que as Comunidades Intermunicipais ocupassem

7 – Este é um modelo que existe em termos teóricos no Chipre, sendo que a sua implantação a todos os cargos dirigentes teria sempre de ser acompanhado de um conjunto de alterações prévias tendentes a assegurar o reforço da independência da CReSAP – garantindo que esta entidade independente passa a ser dotada de uma efectiva autonomia administrativa e financeira, que esta entidade dispõe de um quadro próprio de pessoal e deixa de funcionar junto do Governo. Com mais dados veja-se o nosso “Melhorar o modelo de recrutamento e selecção de dirigentes na administração pública portuguesa” (co-autoria com Professor Doutor Paulo Trigo Pereira), in IPP Report, n.º 7, Julho de 2019 (disponível AQUI).

 

ENTREVISTA DA SEMANA – SR. DR. JOSÉ MANUEL BOLIEIRO, PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE PONTA DELGADA:

 

Após mais de dez anos como Presidente de Câmara, agora que está de saída para outras funções e olhando em retrospetiva, qual considera ter sido o maior desafio que teve de ultrapassar?

 

Pobreza, gestão e coesão territorial.

Dentro daquelas que foram as medidas principais da minha gestão financeira, a necessidade de intervenção e investimento enquanto prioridade máxima disse respeito às questões socioeducativas, onde se insere o combate à pobreza extrema, a inclusão social e o combate à mendicidade e aos sem abrigo, bem como para o facto de a própria autarquia, nos últimos anos, ter sido geradora de emprego. Acresce ainda um investimento, muito significativo, na reabilitação, ampliação e requalificação de edifícios escolares.

Em termos de gestão, orgulhamo-nos com a capacidade demonstrada e com os resultados alcançados, com o equilíbrio orçamental e sem endividamento.

O diálogo e a equidade de tratamento com todas as 24 freguesias do concelho, independentemente da sua respeitada cor partidária, pautou – e distinguiu – a minha ação.

Tem estudado e chamado a atenção para várias “incongruências” no regime jurídico do funcionamento dos órgãos municipais. Considera necessário alterar este regime, nomeadamente quanto à composição das Assembleias Municipais?

 

Defendo a democracia representativa. A verdade eleitoral, na composição do colégio eleitoral. Isto é, o mandato atribuído pelos munícipes é diferente do mandato atribuído pelos fregueses.

Das muitas decisões que tomou, qual considera a mais “emblemática”?

 

A colaboração técnico-financeira com as freguesias, a solução para o Setor Empresarial Local, a introdução do Orçamento Participativo com caráter deliberativo e a redução dos vínculos precários, com integração dos trabalhadores. Mas também, de modo especial, o combate à extrema pobreza e à solidão.

Nos seus mandatos assistiram-se a muitas mudanças, nomeadamente ao nível do aumento do número de turistas. Como lidou e está a ver este fenómeno que parece ser cada vez mais crescente?

 

Com satisfação pelo realizado, mas com a certeza de que ainda há muito a fazer.

Portugal e, em particular, os Açores estão na moda como destino turístico europeu e atlântico. Ponta Delgada é a principal “gateway” do destino açoriano.

A abertura dos céus dos Açores com a nova política das acessibilidades aéreas mudou o panorama de procura turística da ilha de São Miguel a partir de 2015.

Temos de manter a aposta contínua no turismo sustentável e de elevada qualidade, que promova experiências autênticas e identitárias do concelho.

Ademais, temos de evoluir numa progressiva eliminação da contemplação ignorante e ignorada, involuntariamente assumida pelos próprios turistas e entidades públicas. Ponta Delgada está a fazer por isso, ao disponibilizar informação científica, multilingue e digital, sobre o visitado.

Até a reabilitação e regeneração urbanas foram exponenciadas pelo crescimento turístico.

 

Costuma seguir as atividades do Observatório?

Sim, acompanho o vosso trabalho com a proximidade possível. Enalteço a vossa missão de reforçar o poder local como estratégia para salvaguardar o património e a valorização das populações.

Lembra-se de algum assunto específico que devêssemos tratar ou divulgar mais?

Sim. Sugiro a reavaliação crítica do complexo normativo envolvente ao Poder Local e a sua legislação, aliás, já anacrónica.

Como tem acompanhado o processo de descentralização de competências no Continente?

Com reservas, face à casuística, em vez da universalização.

É a favor da regionalização?

Sim.

 

Por último, e em “jeito de balanço” de uma longa atividade autárquica em que ocupou outras funções além de Presidente de Câmara, como gostaria de ser recordado?

Por alguém que procurou alterar mentalidades face ao papel do Poder Local na Democracia e no desenvolvimento local. A pessoa como grande sujeito da ação política.

Agradecemos ao Sr. Presidente a sua disponibilidade em nos ter concedido esta entrevista. Conforme já anunciado, esta foi a primeira entrevista – de várias – que vamos publicar durante o ano de 2020.

 

OUTROS TEMAS:

 

1 – Formação do Observatório em destaque esta semana:

Programa Avançado de Sustentabilidade Municipal

O Observatório das Autarquias Locais promove o Programa Avançado de Sustentabilidade Municipal com o intuito de capacitar as entidades do sector autárquico para a implementação da Agenda 2030 ao nível local.

Este curso tem como objetivo treinar e fornecer aos participantes as ferramentas e recursos necessários para enfrentarem o desafio dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e para promoverem uma transformação local.

Nesse sentido, desenvolvemos um conceito de formação baseado em conhecimento técnico e exemplos de boas práticas em cada um dos 17 ODS que permite definir, implementar e monitorizar estratégias ao nível local para se atingirem as metas e os objetivos de desenvolvimento sustentável globais, nacionais e sub-nacionais.

O valor agregado deste curso consiste em fornecer os materiais e a capacitação técnica necessários para que as entidades do sector local possam desenvolver as suas próprias ferramentas para atingirem os ODS. Por esse motivo, a formação foi concebida como espaço de encontro e intercâmbio, através de uma metodologia de trabalho fundamentalmente prática que incentiva a interação entre os participantes, para que eles possam também aprender uns com os outros.

Com esta ação, pretendemos aprofundar a cooperação e construir alianças que a própria Agenda 2030 considera como elementos-chave para se alcançar o desenvolvimento sustentável global, para que os participantes passem a possuir as ferramentas necessárias ao  aprofundamento dos seus conhecimentos sobre a temática da sustentabilidade e possam manter a sua perspectiva actualizada mesmo após o término do curso.

2 – Principais questões dos leitores recebidas na semana passada:

  • Se for conferido às futuras Regiões tiverem um sistema fiscal próprio, este poderá ser um vetor de desenvolvimento socioeconómico sustentável no longo prazo?
  • É possível os Municípios com atividade taurina,  manterem nos seus territórios uma taxa de 6& de IVA na atividade tauromáquica?
  • É possível reverter os contratos de concessão celebrados pelas autarquias?

 

3 – Notícias do Observatório na imprensa na última semana:

https://zap.aeiou.pt/afinal-centros-historicos-isencao-imi-307859

https://zap.aeiou.pt/autarquias-podem-abandonar-imoveis-historicos-causa-do-imi-300572

 

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