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Revisão do CCP – Observatório tinha razão // Centro Nacional de Arbitragem e atrasos dos tribunais // Artigo – Transferência de competências Freguesias //Acórdão Tribunal Constitucional – Autarquias // Formações

 1 – Observatório tinha razão quando chamou a atenção para a urgência em rever o Código dos Contratos Públicos:

O Governo vai iniciar mais uma revisão do Código dos Contratos Públicos, necessidade que o Observatório das Autarquias Locais alertou e tem dedicado especial atenção, dado os seus impactos em todos os setores de atividade, nomeadamente no setor autárquico.

Como sempre temos referido, será importante que nesta revisão se alcance um equilíbrio entre o princípio da prossecução do interesse público, o princípio da concorrência, o princípio da boa administração e o respeito pelos direitos e interesses dos interessados, mas também, que esta revisão promova propostas claras e compreensíveis para todos os operadores que, no terreno, participam na contratação pública. Na verdade, o Código dos Contratos Públicos também é ou deve ser um instrumento de fomento da economia e empregos locais, respeitando-se ainda assim, os princípios fundamentais dos Tratados, que obrigam o Estado português, mas que não proíbem a adoção de medidas, que tenham em consideração a diferente natureza e estrutura e orçamento, das entidades adjudicantes.

Com efeito, há várias matérias que muito têm constrangido a atividade municipal, obstaculizando uma melhor prossecução do interesse público local. Assim, ao observarmos o conteúdo do Código dos Contratos Públicos, é clara a intenção do legislador em não atender às peculiares especificidades decorrentes das atribuições e competências desenvolvidas pelos órgãos autárquicos. O legislador na transposição das Diretivas de 2014 não acautelou as particularidades assumidas pelo legislador comunitário, quando distinguiu as entidades Centrais das entidades Subcentrais, onde, neste último conceito, se inserem as entidades autárquicas, mas também os entes da Administração Autónoma.

Este assunto por ser fulcral para o interesse nacional, vai ser alvo de grande dedicação por parte dos membros do Observatório e objeto de inúmeras ações ao longo deste ano. Estão já agendadas as seguintes:

Vamos realizar um grande inquérito nacional junto das autarquias para aferição dos aspetos mais relevantes a ter em conta na revisão ao Código dos Contratos Públicos, um conjunto de formações específicas que capacitem os agentes nesta área, a realização de várias conferências em vários pontos do território nacional (especificamente direcionadas para os operadores públicos e privados) e um conjunto de think tanks semanais. Desde já damos nota da realização de um colóquio nacional em parceria com o Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados, com um painel de oradores que permitirá, certamente, uma primeira problematização da futura alteração legislativa.

Deixamos ainda uma mensagem de agradecimento aos elementos do Observatório – que chamaram a atenção às entidades públicas da necessidade desta revisão -, esperando ainda, que as nossas sugestões já apresentadas sejam estudadas, analisadas e incorporadas nesta revisão tão necessária ao Código dos Contratos Públicos.

 

2 – Centro Nacional de Arbitragem da Construção, está a ter um papel muito relevante no combate aos atrasos dos tribunais:

Diversas entidades adjudicantes, “começaram” a utilizar o regime previsto no artigo 476.º do Código dos Contratos Públicos, o qual determina a possibilidade de optarem pela arbitragem institucionalizada para resolverem conflitos emergentes de procedimentos concursais e dos respetivos contratos.

Nesse sentido, vários Municípios estão a indicar o Centro Nacional de Arbitragem da Construção nas suas peças concursais (Anexo XII do Código dos Contratos Públicos), para a resolução alternativa de litígios, sendo que, nos termos do Regulamento de Arbitragem a decisão terá de ser proferida no prazo máximo de quatro meses.

Para os interessados em conhecerem mais profundamente este mecanismo legal, sugerimos as seguintes quatro leituras:

  • Arbitragem Administrativa: Uma Proposta – Tiago Serrão (coordenação), Ana Celeste Carvalho, António Pinto Monteiro, David Pratas Brito, José Duarte Coimbra, Marco Caldeira, Ricardo Pedro, editora Almedina e Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados;
  • Artigo: Contributos para uma análise pragmática do recurso à arbitragem administrativa no contexto do artigo 476.º do CCP – Bartolomeu Noronha, Diretor Executivo do Centro Nacional de Arbitragem, CAAD Revista Arbitragem Administrativa;
  • Manual de Arbitragem – António Pedro Pinto Monteiro, Artur Flamínio da Silva e Daniela Mirante, editora Almedina;
  • Quanto ao recurso à arbitragem no âmbito das concessões de eletricidade em baixa tensão, artigo: A “gestão da liquidação” das atuais concessões – Bartolomeu Noronha, Diretor Executivo do Centro Nacional de Arbitragem da Construção, publicado no n.º 6 (setembro) da Revista de Direito Administrativo.

Para informações sobre a tramitação destes processos, os serviços do Centro Nacional de Arbitragem da Construção, estão disponíveis para prestar informações presencialmente, via telefónica (220 166 577), ou pelo email geral@centrodearbitragemdaconstrucao.pt.

 

3 – Artigo do Sr. Dr. Rui Duarte – O Decreto-Lei n.º 57/2019, de 30 de Abril: o enquadramento normativo da transferência de competências dos municípios para as freguesias:

Sumário: § 1.º Contextualização do novo regime. § 2.º Das competências desconcentradas nas freguesias. § 3.º Do procedimento de efectivação da desconcentração competencial nas freguesias. § 4.º Apreciação geral: a subalternização das freguesias?

  • 1. Contextualização do novo regime
  1. A Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto, que enquadra a transferência de atribuições e competências para as autarquias locais e para as entidades intermunicipais (doravante Lei Quadro de Transferência de Competências para as Autarquias Locais ou LQTCAL), vigente desde 17 de Agosto de 2018, acarretou, atento o que se dispõe no n.º 1 do seu artigo 4.º, a abertura de um processo legislativo tendente à efectivação da desconcentração para os municípios de um conjunto de competências no âmbito de domínios tão variados como são os da educação, da acção social, da saúde ou do património.
  2. De notar que, para além das competências deferidas aos municípios, são ainda conferidas competências às entidades intermunicipais[i] e às freguesias, sendo que algumas das competências a estas últimas outorgadas lhes chegam da administração directa do Estado[ii] enquanto outras, a maioria, lhes advêm dos municípios, mais especificamente, as competências enunciadas nas alíneas que compõem o n.º 2 do artigo 38.º da LQTCAL.
  3. É, pois, na sequência, e no contexto, da estatuição contida no n.º 2 do artigo 38.º da LQTCAL que surge o Decreto-Lei n.º 57/2019, de 30 de Abril, diploma que, no seu artigo 1.º, invoca, aliás, expressamente aqueloutra disposição normativa para efeitos de se assumir enquanto diploma operacionalizador da transferência de competências naqueloutra norma determinada.
  • 2. Das competências desconcentradas: um rápido bosquejo
  1. Cumpre principiar por notar que o legislador, no preâmbulo do Decreto-Lei, assume expressamente ter tomado como padrão ou paradigma, por assim dizer, o regime da Lei n.º 56/2012, de 08 de Novembro (doravante Lei n.º 56/2012), diploma por intermédio do qual se efectivou a chamada reorganização administrativa de Lisboa.
  2. Como se depreende das alíneas a) a c) do artigo 4.º da Lei n.º 56/2012, a reorganização administrativa de Lisboa consubstanciou-se, essencialmente, por um lado, na reconfiguração das freguesias quanto ao seu número (passaram a ser 24) e área geográfica, em segundo lugar, na atribuição legal de novas competências às juntas de freguesia e, finalmente, no (re)escalonamento dos recursos financeiros e humanos correspondentes às novas competências assumidas.
  3. Compulsando o elenco competencial vertido no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019, constata-se existir, com efeito, em assinalável extensão, uma correspondência com várias das competências em que as juntas de freguesia de Lisboa foram investidas pelo artigo 12.º da Lei n.º 56/2012; é o caso, sem pretensão de referenciação exaustiva, das competências previstas nas alíneas a) a e) do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019.
  4. Ainda evidenciando a simetria com a opção metodológica assumida na Lei n.º 56/2012 em matéria de licenciamento da utilização e/ou ocupação da via pública (cfr. a al. g) do artigo 12.º), é de notar que o Decreto-Lei n.º 57/2019 prescreve que as competências referenciadas no n.º 2 do seu artigo 2.º serão exercidas pelos órgãos das freguesias nos termos disciplinados nos regulamentos municipais aplicáveis.
  5. Igualmente patenteando a consonância paradigmática com a Lei n.º 56/2012 – que, no seu artigo 13.º, habilita a Câmara Municipal de Lisboa, precedendo deliberação aprovadora da Assembleia Municipal de Lisboa, a reservar para si o exercício das competências relativas a espaços, vias ou equipamentos considerados de natureza estruturante ou nas quais estejam envolvidas actuações de interesse geral ou comum para a cidade ou para parte significativa desta – também o n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019 habilita a que a assembleia municipal, mediante proposta da câmara municipal, delibere manter no âmbito do município, no todo ou em parte, o exercício das competência previstas no n.º 1 do artigo 2.º, desde que tal se revele indispensável ou se trate de competências conexas com a execução de missões de interesse geral ou comum ao município, ou a parte significativa deste, devendo a proposta da câmara municipal, nesse caso, ser instruída com o parecer de cada uma das juntas de freguesia envolvidas, as quais disporão de 10 dias úteis para se pronunciar, nos termos do n.º 4 do artigo 2.º.
  6. O aspecto procedimental que vimos de referenciar se, por um lado, evidencia a já assinalada proximidade metodológica com a Lei n.º 56/2012, patenteia também, por outro lado, uma faceta diferenciadora do Decreto-Lei n.º 57/2019 relativamente àquela Lei; com efeito, se, nos termos do seu artigo 13.º, esta Lei não alude à participação consultiva das juntas de freguesia, já o Decreto-Lei, no n.º 3 do artigo 2.º, assume tal participação como pressuposto normativamente exigido, com todas as consequências daí potencialmente advenientes, designadamente em sede invalidatória, na eventualidade de tal trâmite vier a ser preterido.
  7. Devemos dizer não conseguir descortinar a razão de ser da diferença de tratamento; com efeito, tanto a Lei n.º 56/2012 como o Decreto-Lei n.º 57/2019, este contextualizado pela LQTCAL, invocam a descentralização e a subsidiariedade enquanto princípios que a visam dar concretização, ambos os diplomas legislativos se concebendo também como promovendo a autonomia local, ambos se contextualizando, outrossim, enquanto teleologicamente orientados à salvaguarda da eficácia e da eficiência da actuação administrativa.
  8. Destarte pois, até considerando, sobretudo, o enquadramento constitucional dos municípios e das freguesias, configurados que são enquanto entes administrativos investidos na legitimidade democrática que lhes advém da circunstância de os seus principais órgãos serem eleitos, os interesses, valores e bens em presença exigiriam que a Lei n.º 56/2012 tivesse salvaguardado também a faculdade de auscultação das juntas de freguesia de Lisboa em sede do que, em última análise, atentos a finalidade e alcance subjacentes ao disposto no artigo 13.º daquela Lei, se consubstancia como uma delimitação funcional e, por essa via, como uma restrição do âmbito de actuação das juntas de freguesia relativamente ao exercício de competências que, afinal de contas, o legislador expressamente considerou como próprias dos órgãos executivos colegiais paroquiais.    
  9. Aliás, deve dizer-se, a propósito, que nos suscita as maiores dúvidas a conformidade com os parâmetros constitucionais pertinentes de normas como as que se contêm no artigo 13.º da Lei n.º 56/2012 e no n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019; com efeito, na medida em que qualquer destas disposições legislativas habilitam a que o concurso de vontades dos órgãos executivos e deliberativos municipais afaste, nas circunstâncias legalmente prescritas, a investidura competencial das juntas de freguesia principialmente decorrente da lei, vem o legislador a permitir, assim, que os actos administrativos corporizados nas deliberações dos órgãos municipais derroguem a imputação competencial decorrente da lei, sobrepondo, em qualquer caso, a análise e a qualificação dos órgãos municipais à opção primária do legislador, infringindo-se, nessa medida, na nossa perspectiva, o mandato constitucional, vertido no n.º 5 do artigo 112.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), segundo o qual, designadamente, é vedado à lei conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, derrogar, modificar ou suspender qualquer dos seus preceitos.
  10. Não sendo possível, por exceder em muito o âmbito que nos circunscrevemos nestas nossas reflexões, levar a cabo uma abordagem circunstanciada de cada uma das competências enumeradas no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019, sempre nos parece possível, sem embargo, qualificar sumariamente, quanto à sua taxonomia, o acervo competencial naquela disposição legal contida.
  11. Assim, exceptuadas aquelas que coenvolvem de forma explícita a prática de actos administrativos – cfr., designadamente, as alíneas h) a m) – o conteúdo de boa parte das competências enumeradas no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019 (tal como muitas das consignadas no artigo 13.º da Lei n.º 56/2012) é de cariz essencialmente executivo, consubstanciando-se o seu exercício em desempenhos de índole predominantemente material.
  12. Deve, a propósito, notar-se que, no Decreto-Lei n.º 57/2019, o legislador se apartou da metodologia que empregou nos demais Decretos-Lei que efectivam o pacote descentralizador, por assim dizer; com efeito, para assentar apenas em dois exemplos, no Decreto-Lei n.º 105/2018, de 29 de Novembro, que tem por objecto as competências no domínio da habitação, e no Decreto-Lei 21/2019, de 30 de Janeiro, que se ocupa das competências em matéria de educação, o legislador expressamente refere a câmara municipal como o órgão investido no exercício de cada um dos acervos competenciais vertidos naqueles diplomas legislativos, sendo que no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019, o legislador se limita a reportar as competências aos órgãos municipais.
  13. Muito embora não pareça suscitarem-se dúvidas, até tendo presente o escalonamento orgânico constitucionalmente assumido no artigo 239.º da Lei Fundamental, que as competências em questão se devam entender reportadas às juntas de freguesia às quais, enquanto órgãos colegiais executivos paroquiais, compete prosseguir as atribuições das referidas autarquias, sob a fiscalização das respectivas assembleias, pensamos que teria sido conveniente o legislador ter sido explícito quanto à imputação competencial.
  • 3. Do procedimento de efectivação da desconcentração das competências nas freguesias
  1. À semelhança do que sucede com muitas outras das competências transferidas para as autarquias locais, também o Decreto-Lei n.º 57/2019 contém provisões a respeito do procedimento a seguir para efectivar a atribuição de recursos às freguesias.
  2. Como prescreve o n.º 1 do artigo 9.º, os recursos a afectar às freguesias provêm do orçamento municipal, sendo calculados em função da estrutura de receitas e despesas implicadas no exercício pelo município das competências a ser transferidas, podendo o exercício daquelas competências, no caso de os recursos enunciados nos números 1 e 2 do artigo 9.º se revelarem insuficientes, vir a ser financiado por receitas provenientes do Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI), nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
  3. Assim, no que concerne ao procedimento propriamente dito, no prazo de 90 dias após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 57/2019 – que ocorreu a 1 de Maio, nos termos do n.º 1 do artigo 12º – a câmara municipal e as juntas de freguesia envolvidas devem, nos termos do n.º 1 do artigo 5.º, acordar numa proposta de transferência de recursos que, acordo que, se vier a ocorrer, determinará a respectiva submissão, no prazo de 30 dias, à deliberação das assembleias municipal e de freguesia nos termos do n.º 2 do mesmo artigo.
  4. Se, pelo contrário, não vier a existir acordo entre a câmara municipal e a junta de freguesia esta, levando à apreciação da assembleia de freguesia a proposta de transferência de recursos, poderá requerer ao presidente da câmara municipal que leve aquela proposta à apreciação e deliberação do órgão colegial executivo municipal[iii], em reunião que deverá ter lugar nos 30 dias seguintes à recepção do requerimento.
  5. Depois de apreciada em reunião da câmara municipal a proposta de transferência de recursos da junta de freguesia, determina o n.º 4 do artigo 5.º que o presidente da câmara municipal, no prazo de 30 dias, solicite a apreciação e votação daquela na assembleia municipal, não podendo a câmara municipal, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo, introduzir alterações à proposta da junta de freguesia.
  6. Se, ainda assim, persistir a falta de acordo entre a câmara municipal e a junta de freguesia, ou caso sobrevenha deliberação negativa por parte de qualquer das assembleias autárquicas em presença, determina o n.º 6 do artigo 5.º que a câmara municipal e a junta de freguesia deverão reiniciar novo procedimento com vista à transferência de recursos.
  7. Parece-nos ser o que vimos de respigar um procedimento potencialmente indutor de demora indevida, com riscos para a celeridade e eficiência que devem pautar a prossecução do interesse público e, nessa medida, a conduta dos órgãos administrativos tanto mais que, sobretudo, nada garante que o reinício de novo procedimento não venha, a final, redundar em nova discordância e, consequentemente, num bloqueio ou, se se preferir, numa paralisia da efectivação da transferência competencial, estado de coisas que o legislador, em última análise, acaba por reconhecer na medida em que o n.º 1 do artigo 11.º, acautelando, decreta que, até à celebração do auto de transferência de recursos, o desempenho das competências continuará a ser assegurado pelos municípios.
  8. Ainda a nível procedimental – embora com consequências que se estendem para lá do âmbito estritamente procedimental – não pode deixar de aludir-se à reversão de competências, prevista no artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 57/2019.
  9. Com efeito, prescreve o n.º 1 do artigo 7.º, o município e a freguesia podem acordar a reversão para o primeiro das competências transferida para a segunda, determinando esse acordo, nos termos do n.º 2, o reingresso no município dos recursos humanos e patrimoniais afectos ao exercício das competências transferidas, incluindo, evidentemente, os recursos humanos, cujos respectivos postos de trabalho serão aditados ao mapa de pessoal do município, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo.
  10. Tal como relativamente ao n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei, também a conformidade com a Constituição do artigo 7.º do Decreto-Lei se nos afigura muitíssimo duvidosa na medida em que na aludida disposição normativo o legislador, de novo, faz sobrepor a ponderação e decisão administrativas a que a norma se reporta à investidura competencial definida na lei, afrontando, também a este conspecto, a proibição contida no n.º 5 do artigo 112.º da CRP.
  11. Repare-se que as competências enumeradas no n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei – que, recorde-se, são as previstas no n.º 2 do artigo 38.º da LQTCAL – são deferidas por via legislativa às freguesias, não resultando de delegação municipal[iv] naquelas; é, a esse respeito, muito elucidativo o cotejo entre o n.º 4 do artigo 11.º e o n.º 2 do artigo 12.º, ambos do Decreto-Lei, do qual deflui que as freguesias que não pretendam ser este ano investidas nas competências previstas no diploma legislativo deverão comunicar esse facto à DGAL, nos termos da segunda das referidas normas, sendo que, por seu turno, a primeira das normas indicia que a comunicação das freguesias ao município opera apenas para efeitos de, e no contexto do, desencadear do procedimento de transferência de recursos a que se reporta o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 57/2019.
  12. Mas, para além do que vem de apontar-se, o artigo 7.º merece-nos ainda censura por, de novo também, não explicitar quais os órgãos da freguesia envolvidos na recusa a que se reporta o n.º 2 do artigo 12.º: com efeito, se é certo que o artigo 3.º do Decreto-Lei nº 57/2019, em termos genéricos e abrangentes, decreta que é a junta de freguesia o órgão que exercerá todas as competências previstas no diploma, ressalva também, não obstante, os casos em que a lei determine haver lugar à intervenção do órgão colegial deliberativo da freguesia.
  13. Porém, não só o Decreto-Lei, como vimos, não exige expressamente que a assembleia de freguesia delibere – em regra, sob proposta da junta de freguesia, nos termos gerais – a respeito da recusa das competências prevista no n.º 2 do artigo 12.º como a Lei n.º 75/2013, de 12 de Setembro, a propósito das competências da assembleia de freguesia, apenas refere, pertinentemente, nas alíneas j) e k) do n.º 2 do artigo 9.º, a faculdade de a assembleia de freguesia, respectivamente, se pronunciar e deliberar acerca de todos os assuntos atinentes às atribuições da freguesia ou sobre todos os assuntos de interesse para a freguesia, por sua iniciativa ou sob proposta da junta de freguesia.
  14. A nosso ver, a recusa de competências a que se reporta o n.º 2 do artigo 12.º do Decreto-Lei deve ser precedida do concurso deliberativo da assembleia de freguesia, até por maioria de razão, dado que a intervenção do órgão colegial deliberativo é exigida, como observámos, em sede de aprovação da proposta de transferência de recursos a que se reporta o artigo 5.º; trata-se, porém, de uma postulação que não tem na lei um reflexo (e resposta) expresso, sendo certo que é consabido princípio do direito administrativo que a competência se não presume, apenas existindo nos precisos termos em que a lei a definir.
  • 4. Apreciação geral: a subalternização das freguesias?
  1. Numa apreciação ampla e sistematicamente enquadrada, afigura-se-nos que as competências em cujo exercício as freguesias vêm agora a ser investidas pelo Decreto-Lei são reflexo do que, a nosso ver, consubstancia uma subalternização das freguesias no panorama jurídico-administrativo português.
  2. Sendo o poder local consabidamente afectado pelos escassos recursos de que dispõe, a falta de recursos das freguesias é especialmente acentuada, o que se reflecte, por sua vez, no elenco de competências que o legislador entendeu agora atribuir-lhes.
  3. Mais grave, porém, é a própria subalternização normativamente assumida, manifestada em normas como a do n.º 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019; com efeito, para lá das considerações acerca da conformidade, ou não, de normas como aquela com Constituição, a própria circunstância de se deixar aos municípios a prerrogativa de definir quais as competências cujo exercício se deve manter ao nível municipal, sendo apenas reconhecido às freguesias o direito de se pronunciar em sede de parecer (não vinculativo) é uma opção que denota uma implícita hierarquização dos interesses em presença.
  4. Ainda mais acentuada surge essa opção de fundo se considerarmos os termos como é normativamente conformado o exercício competencial propriamente dito; com efeito, como igualmente constatámos, várias das competências enunciadas no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 57/2019 serão exercidas pelas juntas de freguesia, determina-o o n.º 2 do referido artigo, aplicando o disposto nos regulamentos municipais envolvidos.
  5. Ora, na medida em que a Constituição (cfr. artigo 241.º) e, na sua esteira, a lei, reconhecem competência regulamentar aos municípios e às freguesias, compreende-se mal que a estas, numa lei que as visa em especial, não seja concedido usar da faculdade regulamentar para efeitos de disciplinar o exercício de competências que o legislador quis deferir-lhes.
  6. Em última análise, a assunção dessa subordinação – dir-se-á que principial – manifesta-se, desde logo, no regime procedimental comum, vertido no Código do Procedimento Administrativo, quando este diploma, no artigo 138.º, ensaia uma relação de infra-/supraordenação entre, por um lado, os regulamentos do Estado e os das autonomias regionais e das autarquias locais (n.º 1) e, por outro lado, entre os dos municípios e os das freguesias.
  7. Como quer se encare os termos da articulação inter-regulamentar a que vimos de aludir – e, a nosso ver, ela muito dificilmente escapará a um juízo de inconstitucionalidade – ela pressupõe um posicionamento dogmático que, ainda que mais ou menos pragmaticamente dirigido a demarcar, por via relacional, os espaços de actuação de cada um dos ordenamentos regulamentares em presença, tem latente a assunção de uma sobreposição do ordenamento regulamentar de âmbito mais vasto que, ainda que não sendo de caracterizar – nem o poderia ser – como estritamente hierárquica, tem inerente, a nosso ver, uma concepção de primazia que, mesmo que restrita a uma dimensão funcional, não deixa, se levada às ultimas consequências, esvaziar ou, pelo menos, limitar fortemente a autonomia regulamentar das freguesias e, mais amplamente, das autarquias locais face aos regulamentos governamentais, na medida em que a, especialidade, normativamente assumida nos números 1 e 2 do artigo 138.º do CPA como salvaguarda última do espaço aplicativo dos regulamentos autárquicos face aos do governo – e dos das freguesias relativamente aos dos municípios – envolverá, em última análise, um presente envenenado, na medida em que pressupuser um ónus, para as autarquias locais, de demonstrar a especialidade dos interesses que, afinal, sendo incumbência das autarquias locais prosseguir, constituem a razão de ser da autonomia regulamentar que constitucionalmente lhes é reconhecida.

i – Sem embargo de o exercício das competências pelos órgãos das entidades intermunicipais depender, nos termos do n.º 2 do artigo 30.º, da prévia manifestação de acordo nesse sentido por parte dos municípios que integram aquelas entidades.

ii – As referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 do artigo 38.º.

iii – Devemos, neste conspecto, assinalar a falta de rigor do legislador; com efeito, decreta o n.º 3 do artigo 5.º, como vimos, que a junta de freguesia poderá requerer ao presidente da câmara municipal que aprecie e delibere sobre a proposta em reunião de câmara.

Ora, na medida em que a norma pressupõe que o requerimento da junta de freguesia seja levado a reunião da câmara municipal, será esta a deliberar sobre o conteúdo do requerimento da junta de freguesia e não presidente da câmara municipal, a quem incumbirá apenas, no âmbito das suas competências de convocação e de condução das reuniões, mediante proposta, submeter o requerimento da junta de freguesia à deliberação do órgão executivo colegial do município. 

iv – Com efeito, é apenas a respeito das competências transferidas pela LQTCAL para os municípios que está prevista a possibilidade de estes, mediante contrato administrativo, delegar competências nos órgãos das freguesias; cfr. o n.º 1 do artigo 29.º da LQTCAL.

 

4 – Acórdão do Tribunal Constitucional julga inconstitucional a norma que impunha às autarquias locais a necessidade de prévia obtenção de parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela administração pública para abertura de procedimentos concursais:
Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 688/2019 (extracto):
O Ministério Público instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal uma ação administrativa especial de impugnação do procedimento concursal, do subsequente despacho de contratação, bem como do subsequente contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado outorgado entre a autarquia local e a trabalhadora, pedindo que fossem declarados nulos.

No caso dos autos, o tribunal a quo determinou a desaplicação da «norma ínsita no n.º 2 do artigo 66.º da Lei n.º 66-B/2012, na parte em que, determinando a observância do disposto nos n.ºs 6 e 7 do artigo 6.º da LVRC [Lei que estabelece os regimes de Vinculação, de Carreiras e de Remunerações da Função Pública], impõe às autarquias locais a prévia obtenção de parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela administração pública para abertura de procedimentos concursais com vista à constituição de relações públicas de emprego público por tempo indeterminado, determinado ou determinável, para carreira geral ou especial e carreiras que ainda não tenham sido objecto de extinção, de revisão ou de decisão de subsistência, destinados a candidatos que não possuam uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado previamente estabelecido».

A questão passa, por isso, pela exigência legal da obtenção do parecer prévio previsto nos n.ºs 6 e 7 do artigo 66.º da Lei n.º 12-A/2008 como requisito necessário para a abertura do referido procedimento concursal.
A norma decorrente dos nos n.ºs 6 e 7 do artigo 6.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, consagra um poder de intervenção governamental quanto à abertura de procedimentos concursais para a constituição de relações jurídicas de emprego público que está previsto no âmbito da administração direta e indireta do Estado onde pode encontrar justificação nos poderes de direção e de superintendência que sobre estas o Governo exerce. No entanto, a norma objeto de fiscalização de constitucionalidade manda aplicar esse regime à administração autárquica, que tem garantias especiais de autonomia consagradas no texto da Lei Fundamental, nomeadamente em termos de ter «quadros de pessoal próprio», não respeitando o estatuto próprio do poder local previsto na Constituição.

Resta-nos, pois, concluir que a norma objeto de fiscalização se traduz na atribuição de um poder absoluto de veto ou bloqueio ao Governo, que pode objetar ao procedimento, caso não concorde com o mérito das soluções preconizadas pelo empregador público local, o que se revela como uma forma constitucionalmente censurada de tutela.

Daqui decorre a inconstitucionalidade da norma que impunha às autarquias locais a necessidade de prévia obtenção de parecer favorável dos membros do Governo responsáveis pelas finanças e pela administração pública para abertura de procedimentos concursais com vista à constituição de relações públicas de emprego público por tempo indeterminado, para carreira geral, destinados a candidatos que não possuam uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado, decorrente da interpretação do n.º 2 do artigo 66.º da Lei que aprovou o Orçamento do Estado para 2013, na parte em que determinava a observância do disposto nos n.ºs 6 e 7 do artigo 6.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, por violação do princípio da autonomia local, consagrado no artigo 6.º, n.º 1, da Constituição.
Consultável AQUI.

5 – Formações do Observatório:

Entre as várias formações e cursos ministrados pelo OAL, destacamos os seguintes por áreas temáticas:

  1. Gestor do Contrato:
    • Formação geral para Gestores do Contrato;
    • Formação sobre a utilização de ferramentas informáticas pelos Gestores do Contrato;
    • Formação para os Gestores do Contrato por especialidades técnicas;
    • Formação avançada para os Gestores do Contrato.
  2. RGPD:
    • Curso de preparação de Encarregados de Proteção de Dados.
  3. Contratação Pública:
    • Gestão de empreitadas;
    • Boas práticas na instrução dos Programas de Concurso e Cadernos de Encargos.
  4. Laboral e Recursos humanos:
    • O Direito Disciplinar dos Trabalhadores em Funções Públicas;
    • O contrato de trabalho na Função Pública;
    • Novo regime de incompatibilidades – Lei 52/2019, de 25 de outubro;
    • Lei Geral do trabalho em funções públicas;
    • Processamento de vencimentos e suplementos / ajudas de custo;
    • Assiduidade, pontualidade / Regime de férias, faltas e licenças;
    • Descentralização Administrativa no âmbito laboral.

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